Mais de 220 vigilantes já foram infectados e 28 morreram vítimas de COVID-19, diz CNTV

Não está nos principais sites de notícia e nem nos jornalísticos de TV, e apesar de invisível aos olhos de muita gente – inclusive autoridades – o setor da segurança privada trava uma verdadeira guerra contra a COVID-19. Segundo a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Vigilância (CNTV), em todo o país, 223 vigilantes já foram vítimas da doença e, desses, 28 perderam a vida.

A CNTV se baseou em informações passadas por sindicatos afiliados em todo o Brasil. Entretanto, segundo a entidade, o número pode ser bem maior por conta das subnotificações.

“O número de infectados é mais difícil de ser mapeado por conta da falta de testes e pela precariedade das informações que chegam. Mesmo assim conseguimos reunir informações para mapear a doença de maneira satisfatória”, explica o presidente da CNTV, José Boaventura.

De acordo com a entidade, os sindicatos cruzaram informações das secretarias municipais de saúde e da imprensa com seus bancos de associados, além de informações passadas por familiares das vítimas.

Segundo o mapeamento feito pela CNTV, o Estado com mais casos de infecções é Pernambuco, com 126 profissionais da segurança contaminados. Já o Estado onde há mais mortes registradas é São Paulo, com 10 óbitos (ver mapa no final do texto).

“Alguns Estados não entram na contagem porque não foi possível confirmar as informações”, diz Boaventura.

Apenas no Estado do Amazonas 26 vigilantes já foram infectados por COVID-19 – Foto: Alex Pazuello

PRATICAMENTE INVISÍVEIS

Considerada uma categoria essencial para a segurança de bancos, hospitais, lojas, shoppings, supermercados, entre outros, os vigilantes não têm o reconhecimento devido. É o que diz Amaro Pereira, também da diretoria da CNTV. De acordo com ele, os vigilantes estão na linha de frente em muitas situações, mas são “praticamente invisíveis”.

“Na maioria das vezes são esses profissionais que fazem o primeiro atendimento quando o paciente chega a um hospital, ou quando o cliente chega em um banco precisando de ajuda. No supermercado ele é o tempo todo procurado para prestar algum tipo de informação”, continua.

“Mesmo assim, boa parte não conta com o material básico necessário para se proteger da COVID-19”, lamenta.

Para tentar proteger esses profissionais, no início de abril o Sindicato dos Vigilantes de Barueri (SP) – do qual Amaro faz parte – acionou a justiça para obrigar as empresas de segurança a fornecerem álcool em gel 70%, máscaras descartáveis e lavatórios para a higienização das mãos.

“Pode parecer uma bobeira, mas nem as empresas de segurança e nem as empresas contratantes estavam fornecendo o material. Muitos trabalhadores estavam atendendo o público, mas sem a proteção mínima recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS)”, explica Amaro.

As ações surtiram efeito e ao menos sete empresas tiveram que providenciar o material. “Para o universo de empresas que há em São Paulo e pela quantidade de ações que ingressamos na Justiça, esse número de decisões é pequeno, mas não deixa de ser uma vitória, destaca.

Em São Paulo ao menos 10 vigilantes perderam a vida em decorrência da COVID-19 – Foto: Carl de Souza / AFP

MUITA GENTE, NENHUMA PROTEÇÃO

Na terça-feira, 28/03, o vigilante André Luiz Góes de Albuquerque, de 39 anos, chegou do trabalho reclamando de muita falta de ar e forte dor no peito. Ele era funcionário de uma empresa terceirizada e prestava serviço em uma loja do Carrefour, na Grande São Paulo. A família então o levou ao Hospital Municipal de Barueri. Ao chegar na unidade de saúde deu entrada e já ficou internado com suspeita de COVID-19. Entretanto, na manhã de domingo, 03/5, seu quadro teve uma piora e após parada cardíaca ele faleceu.

Quase um mês antes, no dia 03/04, o vigilante Carlos José Martins do Valle, funcionário da Delegacia de Comércio Exterior da Receita Federal, que fica no prédio do Ministério da Fazenda, na cidade do Rio de Janeiro, chegou ao trabalho em condições de saúde muito ruins. Apresentava sinais claros de COVID-19, mas o medo de perder o emprego o fez ir até o trabalho, mesmo doente. No dia seguinte pela manhã procurou atendimento em uma UPA do bairro de Irajá, onde morava, mas morreu dentro da ambulância enquanto era socorrido para outro hospital.

Antes disso, no dia 02/04, o profissional de vigilância Luis Papim – funcionário da Albatroz Segurança e Vigilância – que trabalhava na Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), morreu em decorrência de COVID-19. Papim passou mal enquanto trabalhava, no dia 22/03. Ele foi encaminhado a uma unidade de saúde em Itapevi (SP), e depois internado no Pronto Socorro Central da cidade. Entretanto, não resistiu às complicações da doença.

André Góes era funcionário de uma loja do Carrefour na Grande São Paulo – Foto: arquivo pessoal

TRAGÉDIAS ANUNCIADAS

Para o presidente da CNTV, José Boaventura, as mortes dos vigilantes são tragédias já anunciadas. “Poderíamos dizer que a COVID-19 está matando pessoas de todas as classes sociais e setores da sociedade, mas não. Boa parte dessas mortes é resultado da política das empresas e poderia ser evitada. Os profissionais trabalham em locais com grande fluxo de pessoas e sem equipamentos de proteção e materiais de higienização para as mãos, totalmente expostos”, alerta.

“Já tivemos empresas de segurança com focos de contaminação – como o caso da Prossegur de Salvador/BA – e nenhuma providência de desinfecção foi tomada ou testagem dos profissionais realizada. Outro caso gritante foi a contaminação de nove vigilantes terceirizados que prestavam serviço dentro do Banco Central em Brasília/DF. Nove vigilantes contaminados, um deles, inclusive está em estado bem grave”, lamenta.

Para Boaventura, não adianta as empresas investirem em publicidade e dizerem que cuidam do social se esquecem seus próprios colaboradores. “É um quadro cruel mas não deixa de refletir a situação de exploração, um tipo de escravidão moderna onde os empresários apenas utilizam a mão de obra e depois descartam”, finaliza.  

Estado Suspeitos/Infectados Óbitos
Acre 02 01
Amazonas 26 04
Bahia 20 0
Distrito Federal 10 0
Mato Grosso *01 01
Mato Grosso do Sul *01 01
Minas Gerais *01 01
Pernambuco 126 03
Piauí 1 0
Rio de Janeiro 21 06
Rio Grande do Norte 01 0
Rio Grande do Sul 03 1
São Paulo *10 10
Total 223 28

*Não há dados consistentes sobre o número de vigilantes infectados nesses Estados, apenas óbitos.